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39O que pode fazer o psicólogo na escola? Albertina Mitjáns Martinez Resumo Trata-se de um artigo teórico cujo objetivo é apresentar, de forma sintetizada, o amplo leque de possibilidades de atuação do psicólogo na instituição escolar. Mostra a gradual evolução das formas de atuação dos psicólogos no País, em função da emergência de novas concepções teórico-epistemológicas e da sensibilização crescente dos psicólogos com as complexas demandas da educação brasileira. Evidencia as possibilidades de trabalho desses profissionais não apenas na dimensão psicoeducativa da instituição escolar, mas também na sua dimensão psicossocial. Complementando a descrição das formas de atuação do psicólogo, as quais são categorizadas em dois grandes grupos Œ tradicionais e emergentes Œ, discute o vínculo do trabalho do psicólogo escolar com o trabalho dos outros profissionais da escola, destacando a necessidade do trabalho em equipe. Palavras-chave: Psicologia Escolar; escola; atuação do psicólogo. Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010 brought to you by COREView metadata, citation and similar papers at core.ac.ukprovided by Repositório Institucional da Universidade de Brasília
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40AbstractWhat can the psychologist do in school?As a theoretical and an original article, it presents, in a summarized way, a wide range of work possibilities for the school psychologist. It shows a gradual improvement of the psychologists™ approaches in the Brazil due both to the urgency of new epistemic-theoretical ideas and to the increasing psychologists™ awareness regarding the complex educational demands in Brazilian Education. It underlines the work possibilities of these professionals not only from the psycho-educational point of view, but also from the psycho-social one. In addition, these roles Œ that can be divided in two major groups (the traditionalists and the groundbreakers) Œ discuss about the bounds between the school psychologist work and the one of other professionals in schools, underling the need for a team work. Keywords: School Psychology; school; psychologist™s role. IntroduçãoAs possibilidades de atuação do psicólogo na instituição escolar constituem, ainda, um tema de reflexão e de debate entre esses próprios profissionais, especialmente entre aqueles interessados em contribuir para o melhoramento da qualidade do processo educativo. O debate e os questionamentos se expressam, também, em diferentes instâncias do sistema educativo e deles participam, em diferentes graus, gestores, pedagogos e outros especialistas no campo da educação.A nossa experiência de trabalho na escola nos tem demonstrado que o psicólogo muitas vezes é percebido com receio por parte de outros integrantes do coletivo escolar, sendo, às vezes, implicitamente rejeitado, devido à representação de sua incapacidade para resolver os problemas que afetam o cotidiano dessa instituição.Sua atuação se associa frequentemente ao diagnóstico e ao atendimento de crianças com dificuldades emocionais ou de comportamento, bem como à orientação aos pais e aos professores sobre como trabalhar com alunos com esse tipo de problema. Essa situação é resultado do impacto do modelo clínico terapêutico de formação e atuação dos psicólogos no Brasil na representação social dominante sobre a atividade desse profissional.Não existem muitas dúvidas a respeito das funções essenciais que o diretor, o coordenador pedagógico ou o orientador educacional podem desempenhar na escola, porém, em relação ao psicólogo, as dúvidas de imediato surgem: Para que serve o psicólogo? O que pode realmente resolver? Qual a especificidade de seu trabalho em relação ao dos outros profissionais da escola?Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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41No Brasil, existe uma crescente produção científica que mostra pesquisas, reflexões e conceituações dos especialistas em psicologia educacional e psicologia escolar; busca compreender a constituição da Psicologia Escolar como campo de atuação, tendo em conta seus condicionamentos sócio-históricos e científicos; e tenta analisar as formas de atuação e as exigências da formação do psicólogo no contexto educativo. As publicações geradas a partir da atividade do Grupo de Trabalho (GT) Psicologia Escolar/Educacional da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia (Anpepp) são destacadas como parte dessa produção (Weschler, 1996; Novaes, Brito, 1996; Guzzo, 1999; Del Prette, 2001; Almeida, 2003; Martínez, 2005; Campos, 2007).O objetivo deste artigo é apresentar de forma sintetizada e simplificada o amplo leque de possibilidades de atuação do psicólogo na instituição escolar a partir da nossa experiência de trabalho na escola, da crescente produção científica nacional sobre o tema e, especialmente, da gradual evolução das formas de atuação dos psicólogos no País, em função da assunção de novas concepções teórico-epistemológicas e da sensibilização crescente com as complexas demandas da educação brasileira. 1 Alguns pontos de partida: o que entender por Psicologia Escolar? As contribuições da Psicologia no campo educativo não se reduzem ao trabalho do psicólogo na instituição escolar, pois é sabido que os processos educacionais acontecem em diferentes âmbitos e níveis, fazendo com que a articulação Psicologia e Educação assuma diferentes e variadas formas. No entanto, é indiscutível que, no delineamento atual da sociedade, a escola tem um lugar privilegiado como locus dos principais processos educativos intencionais que, juntamente com outros, integram a educação como prática social.O trabalho do psicólogo nessa forma institucionalizada de educação tem sido, já há alguns anos, nosso foco de análise (Martínez, Fariñas, 1993; Martínez, 1996, 2001, 2003a, 2003b, 2005, 2007), o que nos permite conceituar a Psicologia Escolar como:um campo de atuação do psicólogo (e eventualmente de produção científica) caracterizado pela utilização da Psicologia no contexto escolar, com o objetivo de contribuir para otimizar o processo educativo, entendido este como complexo processo de transmissão cultural e de espaço de desenvolvimento da subjetividade (Martinez, 2003b, p. 107).A especificidade do que denominamos Psicologia Escolar em relação a outras áreas ou ramos da Psicologia, tal como estão constituídas hoje, está dada pela conjunção de dois elementos: em primeiro lugar, pelo seu objetivo, sendo esse a contribuição para a otimização dos processos educativos que acontecem na instituição escolar entendidos de forma ampla e também complexa pelos múltiplos fatores que neles intervêm (não apenas aqueles de ordem pedagógica, mas também de ordem subjetiva, relacional e organizacional); e, em segundo lugar, pelo locus de Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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42atuação constituído pelas diferentes instâncias do sistema educativo, em especial a instituição escolar. Na conceituação apresentada, pode-se observar que a Psicologia Escolar não está definida em função de um campo estreito de saberes da Psicologia (por exemplo, Psicologia da Aprendizagem, Psicologia do Desenvolvimento), mas sim a partir da configuração de um campo de atuação profissional que requer a utilização dos múltiplos e diversos saberes organizados em diferentes áreas da Psicologia como ciência particular, sem os quais não é possível contribuir eficazmente para a otimização do processo educativo compreendido na sua complexidade e plurideterminação. O arcabouço de saberes da Psicologia que o psicólogo escolar utiliza na sua atuação está determinado pelas tarefas que se propõe realizar, pelos desafios que sua prática lhe coloca e, sem dúvida, pela representação que tem dos elementos envolvidos nos desafios a enfrentar, independentemente do campo ou da área da Psicologia em que esses conhecimentos tenham sido originariamente produzidos. Essencialmente, o psicólogo escolar é um profissional que utiliza os conhecimentos produzidos sobre o funcionamento psicológico humano para colaborar com os processos de aprendizagem e desenvolvimento que têm lugar no contexto escolar, tendo em conta a complexa teia de elementos e dimensões que nos caracterizam e que, de alguma forma, nos determinam. Se concordarmos que as funções gerais que um psicólogo bem formado pode desempenhar em relação a seu campo de estudo são as de avaliação, diagnóstico, orientação, intervenção, formação, assessoria ou consultoria e pesquisa (Bases, 1987), podemos facilmente inferir a diversidade de formas de atuação que ele pode desenvolver no contexto escolar. No entanto, essa representação da Psicologia Escolar não tem sido a que tradicionalmente marca a configuração do campo de trabalho do psicólogo na instituição escolar, já que, como apontamos anteriormente, durante muito tempo, salvo exceções, a atuação dos psicólogos vinculados ao contexto escolar esteve essencialmente focalizada no diagnóstico, atendimento, orientação e intervenção em relação aos problemas emocionais, de aprendizagem e de comportamento.Uma concepção mais ampla da Psicologia Escolar Œ da qual a conceituação apresentada anteriormente constitui uma expressão Œ vai se fortalecendo, não sem polêmicas, dúvidas e controvérsias, à medida que, dentro da própria Psicologia, vão se consolidando novos enfoques teóricos e epistemológicos. Referimo-nos àqueles que consideram o indivíduo como parte de sistemas relacionais constituídos cultural e historicamente e àqueles que reconhecem a complexidade constitutiva dos indivíduos e dos processos sociais humanos, assim como das práticas sociais das quais a educação constitui uma expressão. As mudanças graduais que se apreciam na concepção da Psicologia Escolar e, simultaneamente, na atuação daqueles psicólogos vinculados ao sistema educativo têm sido também fortemente influídas pelo debate crítico, iniciado na década de 80, em relação às formas de atuação orientadas por um modelo clínico-terapêutico que não corresponde às demandas que a realidade social coloca à Psicologia e Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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43é fruto da crescente sensibilização e compromisso social dos psicólogos com as transformações sociais que o País necessita. Essas mudanças junto à análise de seus determinantes têm sido objeto de diferentes estudos e pesquisas, entre os quais se destacam os trabalhos de Maluf (1994; 2003), Meira (2002), Cruces e Maluf (2007) e Souza (2007). Com o objetivo de apresentar as possibilidades de atuação do psicólogo no contexto escolar, temos feito uma classificação que, pela sua simplicidade, pode resultar discutível. Classificamos as formas de atuação do psicólogo na escola em dois grupos: fitradicionaisfl e fiemergentesfl. Essa classificação tem apenas como objetivo gerar visibilidade sobre as formas de atuação que apresentam correspondência com a concepção ampla de Psicologia Escolar a que temos feito referência e que, mesmo não estando ainda consolidadas no País, se mostram promissoras para fortalecer a contribuição da Psicologia para a otimização dos processos educativos na instituição escolar. No entanto, é importante salientar que ambas as formas de atuação, as fitradicionaisfl Œ aquelas que podem ser consideradas com uma história relativamente consolidada Œ e as fiemergentesfl Œ as que apresentam configuração relativamente recente Œ, coexistem e guardam entre si inter-relações e interdependências diversas. Mesmo que umas sejam mais abrangentes e complexas do que outras e, nesse sentido, potencialmente mais efetivas, consideramos que todas as formas de atuação do psicólogo no contexto escolar, a que faremos referência a seguir, têm seu espaço e resultam importantes, especialmente, se temos em conta as positivas mudanças qualitativas que, como produto das influências já mencionadas, vêm ocorrendo, também, nas funções tradicionalmente desenvolvidas pelos psicólogos na escola. 2 As formas de atuação fitradicionaisfl2.1 Avaliação, diagnóstico, atendimento e encaminhamento de alunos com dificuldades escolaresEssa tem sido uma das mais tradicionais funções do psicólogo na instituição escolar, devido ao viés significativamente clínico que dominou a Psicologia por muitos anos. Na representação social das funções do psicólogo, essa constitui, sem dúvidas, uma das formas de maior destaque. No entanto, a própria concepção de avaliação e diagnóstico das dificuldades escolares vai variando. A consideração da avaliação e do diagnóstico como um momento específico, realizado à margem da situação real em que as dificuldades escolares se expressam, centrado no aluno e feito por um profissional isolado a partir, fundamentalmente, de testes de forte conotação quantitativa ou clínica, vem transformando-se em uma concepção na qual a avaliação e o diagnóstico se configuram como processos nos quais se consideram os espaços sociorrelacionais onde as dificuldades escolares se revelam, no marco de um trabalho em equipe no qual o professor tem um importante papel.Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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44A utilização de variados instrumentos de investigação Œ como a observação dos alunos em situações de atividade escolar cotidiana, as conversações com eles e com aqueles com quem interagem Œ, de jogos e de situações diversas para a compreensão das causas que originam as dificuldades tem colaborado para superar o caráter rotulador do diagnóstico, que em nada ajuda a delinear as estratégias de ação psicopedagógicas necessárias para a superação das dificuldades detectadas. O caráter qualitativo, processual, comunicativo e construtivo do diagnóstico e da avaliação das dificuldades escolares vai superando, não sem dificuldades, o diagnóstico rotulador e estático que caracterizou o diagnóstico das dificuldades escolares durante muitos anos. Salientamos a importância do trabalho do psicólogo direcionado à compreensão da gênese das dificuldades escolares, elemento essencial para o delineamento das estratégias educativas e cujo acompanhamento, em parceria com o professor e com outros profissionais, constitui a via para a superação dos problemas detectados.A tarefa de encaminhamento dos alunos para outros profissionais especializados fora da instituição escolar é realizada pelo psicólogo em casos excepcionais, nos quais, esgotados todos os esforços junto à equipe da escola, sua complexidade e especificidade assim o demandem. A prática de encaminhar as crianças para outros profissionais, sem uma situação excepcional que a justifique, tem sido evidenciada, em muitos casos, como extremamente nociva, já que o próprio aluno e a família incorporam a crença da existência de sérias dificuldades na criança, o que contribui para gerar sentidos subjetivos que fireforçamfl a dificuldade inicial e que podem, inclusive, criar dificuldades adicionais.2.2 Orientação a alunos e pais O trabalho de orientação a alunos e pais em relação às dificuldades escolares e a outros assuntos de interesse para o desenvolvimento do estudante tem constituído uma das atuações tradicionais do psicólogo. A orientação psicológica diferente da psicoterapia (que não é função de um psicólogo na escola) implica ações de aconselhamento em função das necessidades específicas do desenvolvimento do educando. Tradicionalmente, esse trabalho tem se expressado fundamentalmente em ações interventivas, em colaboração com outros profissionais da escola, visando à superação de dificuldades concretas, porém tem começado, também, a assumir objetivos promocionais de bem-estar emocional e de desenvolvimento de importantes recursos psicológicos em correspondência com os objetivos da educação integral que a escola propõe. Um olhar atento ao desenvolvimento integral dos estudantes permite ao psicólogo estruturar um trabalho de orientação a alunos e pais, seja de forma individualizada, seja de forma grupal, que contribua para o desenvolvimento almejado. A coordenação de grupos de orientação a pais, em função de suas demandas no que diz respeito aos aspectos psicológicos do desenvolvimento e da educação dos Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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46contribui para o processo educativo. Da aprendizagem Œ como uma função do sujeito que aprende Œ participa, junto com importantes fatores contextuais e sociorrelacionais, a configuração subjetiva do aluno em toda a sua complexidade, e não apenas como uma dimensão ficognitivafl. Isso supõe a necessidade de considerar a complexidade constitutiva da subjetividade no trabalho para a superação das dificuldades, uma vez que muitas dificuldades escolares se alastram e se cristalizam precisamente pela falta de estratégias de atuação que tenham em conta a multiplicidade de elementos que dela participam. A orientação aos professores, assim como a contribuição para sua formação no que diz respeito à complexidade, à especificidade e à singularidade dos processos subjetivos implicados na aprendizagem e no desenvolvimento nas suas mais variadas formas de expressão, torna-se uma importante contribuição do psicólogo na instituição escolar. 2.6 Elaboração e coordenação de projetos educativos específicos (em relação, por exemplo, à violência, ao uso de drogas, à gravidez precoce, ao preconceito, entre outros)Referimo-nos aqui às estratégias de intervenção cuja complexidade e abrangência implicam a estruturação de vários tipos de ações das quais participam, de forma coordenada, outros profissionais da escola. Na maioria das vezes, esses projetos surgem como resposta aos problemas concretos que se expressam na escola ou na comunidade onde a instituição está inserida. Porém, cada vez com maior frequência, essas estratégias aparecem definidas não apenas pela situação concreta da instituição escolar, mas também pelos objetivos delineados na proposta pedagógica e pelas prioridades definidas para o trabalho educativo, assumindo, assim, uma natureza essencialmente preventiva. Sabe- se que, para contribuir no sentido de mudanças reais nas formas pelas quais os indivíduos pensam, sentem e atuam, são requeridas estratégias educativas sistêmicas e permanentes, em correspondência tanto com a complexidade da subjetividade humana quanto com a complexidade de seus processos de mudança. Por essas razões, o trabalho do psicólogo, nessa direção, tem particular relevância. Como é possível observar, as formas de atuação a que temos feito referência neste grupo, denominadas formas de atuação fitradicionaisfl, estão principalmente associadas à dimensão psicoeducativa do contexto escolar, dimensão essa que tem sido o principal objeto de atenção no trabalho da instituição escolar e na qual se centram a atenção de todos os seus atores, entre eles, os psicólogos. Apesar da evolução qualitativa que se aprecia nas formas de atuação consideradas neste grupo, elas estão definidas, em grande parte, pelos problemas concretos que, em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem dos alunos, tem que ser enfrentados e resolvidos no cotidiano escolar, e para os quais o trabalho do psicólogo se configura como uma resposta. Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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47A seguir nos referiremos às formas de atuação que têm adquirido visibilidade nos últimos anos e que estão associadas a uma concepção muito mais ampla e abrangente do psicólogo na instituição escolar. Na maioria delas, a atitude pró-ativa do psicólogo é essencial, já que dificilmente lhe são colocadas como demandas explícitas na escola. 3 Formas de atuação fiemergentesfl 3.1 Diagnóstico, análise e intervenção em nível institucional, especialmente no que diz respeito à subjetividade social da escola, visando delinear estratégias de trabalho favorecedoras das mudanças necessárias para a otimização do processo educativoA caracterização e o funcionamento da escola como instituição, bem como o impacto dessa nos processos de ensino-aprendizagem que nela se desenvolvem e no cumprimento da sua função educativa em um sentido mais geral, têm sido temas relativamente pouco abordados pela Psicologia Escolar, a qual, como já salientamos, tem focalizado muito mais a dimensão psicoeducativa do que propriamente a dimensão psicossocial da escola. Porém, à medida que se reconhece que os indivíduos se constituem e, simultaneamente, são constituidores dos contextos sociais nos quais estão inseridos, os aspectos organizacionais da escola como instituição, em especial sua subjetividade social,1 adquirem especial importância. Esses constituem aspectos relevantes para compreendermos os processos relacionais que ocorrem na escola e que participam dos modos pelos quais os profissionais e os alunos sentem, pensam e atuam nesse espaço.Por sua vez, a ação dos sujeitos nesse espaço social contribui para a configuração subjetiva que este assume, estabelecendo-se uma relação recursiva entre subjetividades individuais e subjetividade social. Os sistemas de relações que se dão entre os membros da instituição, os estilos de gestão, os valores, as normas e o clima emocional constituem apenas alguns exemplos de importantes fatores que influem, direta ou indiretamente, não apenas nos modos de agir dos integrantes do coletivo escolar, mas também nos seus estados emocionais, na sua satisfação com a instituição e no seu compromisso e motivação com as atividades que realizam.Tradicionalmente, aspectos relacionados com processos grupais, liderança, estilos de gestão, motivação para o trabalho, clima e cultura organizacional, estresse laboral, etc., têm sido estudados em áreas da Psicologia (Psicologia Social, Psicologia Organizacional, Psicologia do Trabalho, etc.) que não são vistas como próximas da Psicologia Escolar, mesmo que os conhecimentos produzidos em relação a tais temas sejam essenciais para o trabalho do psicólogo na escola. 1 Assumimos a Teoria da Subjetividade que Fernando González Rey (1999, p. 108) tem desenvolvido a partir de uma perspectiva histórico-cultural na qual a subjetividade se conceitua como fia organização dos processos de sentido e significado que aparecem e se organizam de diferentes formas e em diferentes níveis no sujeito e na personalidade, assim como nos diferentes espaços sociais em que o sujeito atuafl.Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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48Enxergar a escola não apenas como um lugar onde uns ensinam e outros aprendem, mas também como um espaço social sui generis no qual as pessoas convivem e atuam, implica reconhecer a importância da sua dimensão psicossocial, assim como o papel do trabalho do psicólogo escolar nessa importante dimensão.A partir de um sensível processo de diagnóstico e análise das necessidades institucionais, o psicólogo pode sugerir, delinear e coordenar estratégias de intervenção direcionadas a potencializar o trabalho em equipe, mudar representações cristalizadas e inadequadas sobre o processo educativo, desenvolver habilidades comunicativas, mediar conflitos, incentivar a criatividade e a inovação, melhorar a qualidade de vida no trabalho e outras tantas ações, como contribuição significativa para o aprimoramento do funcionamento organizacional. Poder vislumbrar a escola, simultaneamente, nas dimensões psicoeducativa e psicossocial permite ao psicólogo o delineamento de estratégias de trabalho que, a partir da articulação das duas dimensões, sejam mais efetivas para a otimização dos processos educativos que ocorrem nela. A interessante proposta de Marinho- Araújo e Almeida (2005) para a atuação preventiva do psicólogo na instituição escolar expressa, em grande medida, essa ideia. 3.2 Participação na construção, no acompanhamento e na avaliação da proposta pedagógica da escolaApesar de se estabelecer como uma importante exigência para o funcionamento escolar, a proposta pedagógica, em muitas escolas, não é ainda produto de um trabalho coletivo dos integrantes da instituição, nem funciona como um referente real que dá a coerência necessária ao trabalho educativo que nela se realiza. Em muitas instituições escolares, constitui um documento formal que pouco se relaciona com a realidade da vida escolar. Tendo em conta que a proposta pedagógica não é apenas o documento escrito, mas sim a intencionalidade educativa que se expressa de maneira viva no conteúdo e na forma que assumem as ações educativas que caracterizam o trabalho da escola, faz-se evidente a importância de um conjunto de fatores para os quais, por sua natureza, o psicólogo pode contribuir significativamente. Entre eles, podemos salientar o trabalho coletivo, a reflexão conjunta, os processos de comunicação, a negociação de interesses e de pontos de vistas diferentes, assim como os processos de mudança, criatividade e inovação.O psicólogo escolar pode atuar de múltiplas formas, visando que a proposta pedagógica constitua-se efetivamente como um instrumento útil para a organização coerente do trabalho educativo. Seu trabalho pode ser especialmente importante na integração e na coesão da equipe escolar; na coordenação do trabalho em grupo; na mudança de representações, crenças e mitos; na definição coletiva de funções; e no processo de negociação e resolução de conflitos, os quais são frequentes em qualquer tipo de trabalho coletivo que implique o encontro de pontos de vistas diferentes. Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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49Particular importância tem, também, o trabalho que o psicólogo pode realizar na geração de ideias e na solução criativa de problemas utilizando técnicas específicas. 3.3 Participação no processo de seleção dos membros da equipe pedagógica e no processo de avaliação dos resultados do trabalhoFundamentalmente no ensino particular, dá-se cada vez mais atenção à qualidade dos processos de recrutamento e seleção dos membros da equipe pedagógica, com o objetivo de escolher os candidatos que melhor possam desenvolver um trabalho potencialmente efetivo. O psicólogo participa com os outros membros da equipe de direção pedagógica na fundamentação e no delineamento geral do sistema de seleção, levando em consideração a preparação e as características requeridas para o exercício de cada uma das funções a serem realizadas, em correspondência com a proposta pedagógica da escola e seus objetivos institucionais mais gerais. O psicólogo também participa na elaboração dos instrumentos (escritos, vivenciais, de execução, etc.) que integram o sistema de seleção e atua no processo de avaliação dos candidatos a partir dos indicadores que vão sendo gerados pelas informações proporcionadas por esses instrumentos. O processo de autoavaliação e avaliação individual e coletiva dos resultados do trabalho educativo realizado ainda não faz parte da cultura escolar. O psicólogo pode contribuir para o delineamento de sistemas e estratégias de avaliação que, simultaneamente com seu objetivo de evidenciar os pontos fortes e fracos do trabalho realizado, visando a seu aprimoramento, possam, também, se constituir num processo construtivo de desenvolvimento para todos os envolvidos. O processo de ressignificação da avaliação do trabalho Œ que possui uma conotação negativa por razões muito diversas, dentre as quais se destaca o significado negativo com o qual os processos de avaliação em geral aparecem na representação social dominante Œ emerge como um importante desafio para o trabalho do psicólogo. A este último corresponde delinear estratégias e ações tanto individuais quanto coletivas que possam contribuir para vencer resistências e para superar os obstáculos que impedem a utilização desse importante instrumento de trabalho no contexto escolar. 3.4 Contribuição para a coesão da equipe de direção pedagógica e para sua formação técnica Existe hoje uma ampla produção científica que baliza a importância e a necessidade do trabalho em equipe para se atingir os objetivos organizacionais, sendo que a instituição escolar, como um tipo específico de organização, não escapa a essa regra. Nessa instituição, o trabalho em equipe torna-se particularmente relevante, já que, devido à complexidade dos processos educativos que constituem seu foco, são Em Aberto, Brasília, v. 23, n. 83, p. 39-56, mar. 2010
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